domingo, 1 de fevereiro de 2009

CONCURSO LITERÁRIO DE CRÔNICAS ASTRA

Ficou pronto em janeiro os mil exemplares do livro com os 20 textos vencedores do 1º Concurso Literário de Crônicas Astra. Além das vinte crônicas premiadas, com foto e perfil de cada autor, a publicação traz uma introdução que fala sobre todo o processo do concurso e o prefácio da escritora Sônia Cintra, no total de 92 páginas. Cada um dos vinte primeiros colocados ganhou 10 exemplares do livro. Os membros das academias de letras de Jundiaí que participaram do julgamento e as lideranças da Astra também receberam a obra. Os demais livros serão distribuídos a critério da empresa para os contatos externos, além de sorteios entre os funcionários e colocação de exemplares na Biblioteca Astra.
Site ASTRA-SA

O tema deste concurso de crônicas foi "O MEIO AMBIENTE". Foram 2125 textos participantes e o meu ficou entre os 20 selecionados. Leia a minha crônica que integra a bem organizada e bela antologia Astra.

Leia a minha crônica.

O MEIO AMBIENTE

A idéia de fazer um abaixo-assinado para salvar o planeta, foi do Paranhos. Começariam com a assinatura dos moradores do bairro. Depois, passariam para o resto do município, para todas as cidades do estado, todos os estados do Brasil e todos os países, até atingirem o mundo inteiro. A lista deveria ser uma tira de papel quilométrica, capaz de circundar a terra, como se formasse um laço.
Os diretores da associação do bairro distribuíam panfletos, conclamando os moradores A maioria lia rapidamente e atirava o papel no chão. Marcaram uma reunião na casa da Professora Irani, para implementarem o projeto. Os convocados chegaram pontualmente, cumprimentando-se entusiasmados:
–Saudações ecológicas!
–Saudações ecológicas! -a voz aguda era do papagaio da casa.
Como presidente da associação e progenitor da idéia, Paranhos iniciou a sessão:
–O planeta pede socorro. Vamos fazer um abaixo-assinado, exigindo que os países ricos parem de poluir. Vejam como está quente, não chove, não tem umidade no ar. É o efeito estufa.
–Planeta pede socorro - o louro remedou.
–Oh papagaio! Que papagaio falador, meu Deus! –Paranhos achou interessante a ave no galho da goiabeira.
–Papagaio, papagaio... –era o Confúcio, papagaio de estimação da professora. Foi comprado de um vendedor clandestino, ela confidenciou quase sussurrando. Veio filhotinho, teve que alimentá-lo no bico.
Retomando o assunto em questão, Dona Irani fez uma explanação comovente:
–E o pobre animal em extinção? Pensem na baleia, que agoniza no mar! Pensem nos furacões, nos ciclones, nos tsunamis e nas grandes tragédias, que os governantes desnaturados provocam, com a emissão de gases poluentes!
–Pobre animal em extinção... –Confúcio repetia, provocando risos.
Um rato enorme apareceu no meio da varanda. Passou veloz sobre os pés das pessoas e desapareceu entre as árvores. A anfitriã explicou que veio do lote ao lado, cujo dono não vendia, não construía e nem limpava.
O Dr. Galvão pretendia colocar em prática as suas idéias brilhantes:
–Os hipócritas, esquecem-se dos pequenos, tão imbuídos que estão nas grandes causas! Falo dos Estados unidos e outros, que estão acabando com a camada de ozônio. Quando o abaixo-assinado estiver com a extensão total da terra, vamos levá-lo à reunião da ONU, para conscientizar os países ricos de suas responsabilidades. Será o nosso desagravo, o nosso prote...
Ninguém conseguiu ouvir mais nada. Passou um carro de propaganda na rua, com o volume além do suportável. O louro arrepiou as penas, pôs o pé no ouvido minúsculo e berrou:
–Hipóquitas, esquecem pequenos, buídos grandes causas!
Dona Irani serviu um lanche para os convidados. O Paranhos prosseguiu eloqüente:
–O meio ambiente precisa ser preservado e devemos tomar a atitude. Precisamos salvar a floresta amazônica, o nosso pulmão. Vamos exigir que tenha vigilância constante.
–Meio ambiente precisa ser preservado, devemos tomar atitude... –O danado do bicho repetia.
Perceberam um cheiro fétido no ar. Era do curtume do Dr. Galvão, já conheciam bem. Uma senhora não conseguiu disfarçar o nojo:
–Hum... Que fedor!
–Hum.. Fedor... –Confúcio também percebeu.
–Depende de nós começarmos as mudanças. Colheremos assinaturas de todos os moradores do planeta. Colaremos as tiras de papel umas nas outras, até formar uma big tira, que irá entrelaçar a terra. Daremos um abraço simbólico na mãe terra, com o nosso abaix... –o Paranhos foi tomado pela tosse, não podendo concluir a oratória.
Todos tossiram, até o louro. Uma fumaça pesada invadiu a varanda. Era o Senhor Afonso queimando o lixo e o mato seco, da capina que fizera em seu terreno.
–Queimadas não são corretas. –Dona Irani comentou com a voz embargada pela tosse.
–Queimadas não corretas... –O papagaio repetiu. Papagaios sempre repetem o que os humanos dizem.
Terminada a refeição, os restos de comida, os copos e guardanapos descartáveis foram atirados no lote vizinho. O tempo foi fechando e de repente, desabou uma tempestade. A água inundou a varanda. Os visitantes subiram em cadeiras e mesas. O Dr. Galvão reclamava, sentado em uma mesa, com as pernas dependuradas:
–Os bueiros estão entupidos, precisam desentupir os bueiros para escoar a água!
Escondido entre as folhas da goiabeira, Confúcio emendou:
–Saudações ecológicas! Planeta pede socorro, papagaio, pobre animal extinção, os hipóquitas, esquecem os pequenos, buídos que tão as grandes causas, meio ambiente precisa ser preservado, devemos tomar atitude, hum fedor... Depende de nós começar mudanças, queimadas não corretas, bueiros entupidos, precisa desentupir bueiros.
A chuva passou. Ficou um clima pesado entre os ecologistas, uma mudez. Confúcio não estava apenas repetindo, o que os humanos diziam. Fazia-os calar, confundia e emaranhava as suas mentes. Encerraram a reunião. Prometeram fazer outra, para reverem o tema. Despediram-se com lacônicos “até logo”.
No caminho de volta para casa, Paranhos ia recolhendo os panfletos que divulgavam o “abaixo-assinado ecológico”, jogados nas ruas.
DORA OLIVEIRA